Zoológicos devem ser proibidos?

dsc 7746

Zoológicos são locais específicos para se manter animais selvagens que podem ser exibidos ao público. Por muito tempo, foram marcados por abusos e maus tratos e, ainda hoje, são frequentemente denunciados pelo mesmo motivo. Porém, devemos proibi-los?

As primeiras coleções de animais do mundo foram criados em 3500 A.C., em uma área correspondente ao atual Egito. Inicialmente, esses locais eram construídos para proteger animais considerados sagrados e para demonstrar poder, uma vez que apenas a nobreza poderia manter esses recintos. Essa prática tornou-se comum em diversas civilizações antigas, com destaque para a China, Índia, Mesopotâmia, Pérsia e, posteriormente, a Roma Antiga, onde os animais eram guardados principalmente para serem apresentados em lutas que aconteciam nas arenas e no Coliseu.

Imagem relacionadaImagem relacionada

Durante a Idade Média (entre os séculos V e XV), essa tradição se manteve em diversas regiões da Ásia, África e, sobretudo, na Europa, onde esses locais receberam o nome de Menagerie. Esses espaços privados, geralmente, estavam associados a famílias reais, que construíam exposições privadas de espécies exóticas, geralmente relacionadas a seus castelos, com destaque para a Torre de Londres no século XIII e para o Palácio de Versalhes, no século XVII. Nesses ambientes, os animais viviam confinados em pequenos espaços e eram submetidos a diversos tipos de abuso, principalmente os grandes predadores, como ursos e leões.

07 1812 politos royal menagerie exeter change strand

Representação do Menagerie da Torre de Londres

O conceito atual de zoológico surgiu em 1752, em Viena, no Tiergarten Schönbrunn (zoológico que ainda se encontra aberto nos dias de hoje), após a abertura do local para a visitação de toda a população, e não mais apenas da aristocracia. Rapidamente, os zoológicos tornaram-se um símbolo de ostentação e poder, não só para a nobreza, mas também para a burguesia da época. Até o século XX, donos de zoológicos pagavam caçadores profissionais para perseguir e capturar animais selvagens de diversas regiões do mundo, visando aumentar suas coleções e, mais recentemente, para proteger espécies raras, apesar do seu pouco tempo de vida em cativeiro, devido às suas péssimas condições de vida. Em diversas partes do mundo, animais extintos na natureza ainda viveram em zoológicos por muitos anos, o que moldaria esses ambientes no próximo século.

Resultado de imagem para last thylacine

Último tigre-da-tasmânia conhecido morreu em 7 de setembro 1936 em um zoológico da Alemanha

A partir de 1970, muitos zoológicos do mundo criaram programas de conservação visando, além da preservação de exemplares vivos, à reprodução de espécies em cativeiro, com programas de intercâmbio de animais entre essas instituições. A captura de espécies exclusivamente para expandir as coleções de zoológicos cessou e os recintos passaram a ser ampliados para garantir melhores condições de vida para os animais. Mesmo assim, centenas de casos de maus tratos a animais em zoológicos vão parar na mídia todos os anos, com destaque para zoológicos do leste europeu e do sudeste asiático, o que levanta a seguinte dúvida: zoológicos valem a pena?

Primeiramente, vale ressaltar que não existe algo como “zoológicos bons” e “zoológicos ruins”. Embora algumas dessas instalações tenham fama internacional devido aos esforços de conservação e outras sejam processadas constantemente por abusos, a diferença entre elas costuma ser bem mais tênue. Diversos zoológicos foram abandonados nos últimos anos devido às guerras e conflitos armados, deixando seus animais morrerem de fome e de sede, enquanto em outros, os animais apanham ou são torturados caso o seu comportamento não seja adequado conforme julgam os tratadores ou durante as exibições para os visitantes. Casos recentes, como o do gorila morto a tiros no zoológico de Cincinnati, nos Estados Unidos, além de denúncias contra o SeaWorld e contra o San Diego Zoo levantaram diversos debates sobre a ética por trás de animais mantidos em cativeiro.

Resultado de imagem para giraffe killed zoo

Corpo de girafa morta em zoológico da Dinamarca por tratadores para evitar cruzamento consanguíneo foi jogado aos leões, o que despertou grande revolta na população local.

Por outro lado, esforços de conservação devem também ser levados em conta. Atualmente, mais de 90% dos animais mantidos em zoológicos na Europa nasceram em cativeiro, embora apenas 10% represente espécies ameaçadas. Nos últimos anos, 33 espécies já extintas na natureza mantiveram populações relativamente estáveis em cativeiro, devido a programas de conservação realizados por zoológicos. O órix-cimitarra (Oryx dammah), por exemplo, desapareceu da natureza no ano 2000, mas cerca de 15 mil animais ainda vivem em coleções privadas e em zoológicos e, futuramente, poderão ser reintroduzidos em seu ambiente natural. Esforços dessas instituições conseguiram, também, preservar até o ano de 2018 os últimos rinocerontes-brancos-do-norte existentes. Infelizmente o último macho dessa espécie morreu esse ano, mas seu legado será eternamente lembrado na história da preservação de espécies em extinção.

Resultado de imagem para órix cimitarra

Órix-cimitarra, espécie extinta na natureza – Foto pela Exotic Wildlife Association

Uma das maiores ameaças para a fauna, atualmente, é o tráfico internacional. Somente no Brasil, entre 12 e 38 milhões de animais são retirados da natureza por ano para serem vendidos no mercado ilegal. Diversos bichos apreendidos vão parar em zoológicos, onde viverão o resto de suas vidas, uma vez que sua devolução para o ambiente natural é um processo delicado e que demanda muitos recursos. A proibição de zoológicos poderia, portanto, condenar milhares de animais à morte anualmente.

DSC_7383.JPG

Mico-leão-dourado, espécie frequentemente vítima do tráfico – Foto por Pedro Henrique Tunes tirada no Zoológico de Belo Horizonte

Por fim, zoológicos são essenciais para a conscientização ambiental. Ao conhecer uma determinada espécie, a população tende a ter mais empatia com programas de conservação destinadas a ela e a condenarem atividades que coloquem a sua vida em risco. Após a abertura do  Centro de Pesquisa e Reprodução de Pandas-gigantes de Chengdu, na China, as doações para o local aumentaram exponencialmente nos anos seguintes, o que forneceu mais recursos para as instalações, possibilitando que esse animal saísse da lista de espécies ameaçadas.

Resultado de imagem para Chengdu pandas

Pandas-gigantes no Centro de Pesquisa e Reprodução de Pandas-gigantes de Chengdu – Por China Discovery

Então, devemos condenar diversos animais a uma vida em cativeiro para o bem estar de sua espécie? Temos o direito de permitir que alguns animais sejam torturados pelo bem de outros? E ainda, temos o direito de intervir nos zoológicos, uma vez que a sua existência é um aspecto cultural de diversos países? Não pretendemos, com esse texto, dar essas respostas, mas deixar uma reflexão baseada em experiências pessoais:

Na semana passada, tive a oportunidade de conhecer o Zoológico Nacional de Chile, em Santiago. Localizado no Parque Metropolitano e inaugurado em 1925, o parque conta com mais de 1000 animais, de 158 espécies diferentes. À primeira vista, o local parece um verdadeiro paraíso para seus moradores,  distribuídos em recintos interativos e com diversos enriquecimentos ambientais. Apesar dos cenários espetaculares, foi outra coisa que me chamou a atenção.

DSC_7766.jpg

Lêmures-de-cauda-anelada no Zoológico Nacional do Chile – Foto por Pedro Henrique Tunes

Além da enorme diversidade de animais pouco comum em zoológicos brasileiros, como bongos, suricatos, ursos e porcos-espinho, ele não só possui uma enorme diversidade de animais chilenos, como também diversos programas de reprodução e de reintrodução desses animais, com destaque para o condor-dos-andes, para a rã-de-Darwin (Rhinoderma darwinii) e para o pinguim-de-Humboldt (Spheniscus humboldti), sua principal atração. Seus esforços têm ajudado a recuperar as populações dessas três espécies, que, infelizmente, ainda enfrentam ameaças externas.

DSC_7800.jpg

Pinguim-de-Humboldt, espécie protegida pelo Zoológico Nacional do Chile – Foto por Pedro Henrique Tunes

Portanto, creio que zoológicos podem, sim, ter suas vantagens, caso seus recursos sejam bem empregados e seu trabalho de conscientização ambiental seja realizado, juntamente com os cuidados para o bem estar animal. O zoológico de Belo Horizonte, por exemplo, possui vários programas de reprodução de animais nativos, que, lamentavelmente, vêm sofrendo com cortes de verbas governamentais.

O fato é que os zoológicos devem existir para garantir a preservação, conscientização e o bem estar animal, devendo ser utilizados como aliados, e não como vilões, para a conservação de nossa fauna.

 

 

Referências

Texto “Are zoos good or bad” do How Stuff Works

Texto “HISTORY OF ZOOS” do canal CBD

Livro “Imperialismo Ecológico”, de Alfred W. Crosby

Documentário “Blackfish” sobre a captura de orcas e os maus tratos no SeaWorld

Notícias:

Gorila morto a tiros em zoológico :https://www.bbc.com/news/world-us-canada-36407643

Girafa morta em zoológico: https://www.bbc.co.uk/news/science-environment-26118748

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *