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A Teoria de Tudo que está Vivo – Parte III – O Reinado dos Mamíferos

Vimos o surgimento da vida complexa, a sua quase destruição e o aparecimento dos maiores animais terrestres de todos os tempos. O último capítulo de nossa história terminou com a queda de um enorme meteoro em nosso planeta, o que gerou uma escuridão quase completa por dois anos, que matou a maior parte das plantas,…

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Vimos o surgimento da vida complexa, a sua quase destruição e o aparecimento dos maiores animais terrestres de todos os tempos. O último capítulo de nossa história terminou com a queda de um enorme meteoro em nosso planeta, o que gerou uma escuridão quase completa por dois anos, que matou a maior parte das plantas, algas e animais. Dentre os grupos perdidos, encontram-se os pliossauros, plesiossauros, mosassauros, amonitas, pterossauros e a maior parte dos dinossauros. Os poucos sobreviventes desse desastre diversificaram-se e se espalharam pelos continentes durante o Cenozoico, que veremos a seguir.

Para facilitar o entendimento da cronologia dessa era geológica, dividiremos os dois períodos do Cenozoico (Paleogeno e Neoceno) em suas respectivas subdivisões, denominadas “épocas”. Além disso, devido à maior proximidade temporal desse capítulo de nossa história, um número superior de espécies e de evidências de evolução será apresentado. Focarei, portanto, em grupos de animais e de plantas com representantes vivos atualmente, sobretudo mamíferos,  e darei um enfoque maior ao que acontecia na América do Sul, que permaneceu isolada dos outros continentes por milhões de anos.

Paleogeno – 65 milhões a 23 milhões de anos atrás

Paleoceno – 65 milhões a 56 milhões de anos atrás

Os primeiros 10 milhões de anos do Cenozoico foram marcados por uma diversidade baixa de plantas, em um mundo que ainda se recuperava da queda de um asteroide gigante. A extinção de animais grandes, entretanto, abriu espaço para um processo de diversificação intenso, uma vez que vários nichos ecológicos tinham sido esvaziados durante o fim do  Cretáceo.

A maioria dos continentes já se encontrava em suas posições atuais durante o Paleoceno. Entretanto, o clima quente do planeta fez com que florestas tropicais se espalhassem por todos continentes, inclusive nos polos. Isso fez com que continentes isolados, como a America do Sul, Índia e Austrália (os dois últimos são considerados continentes pelas definições atuais) adquirissem uma fauna completamente única.

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Mapa do planeta pouco antes do fim do Período Cretáceo

Antes do fim do Cretáceo, surgiu um  grupo de mamíferos placentários (animais que possuem uma placenta que, dentre diversas funções, serve como fonte de nutrientes e oxigênio para o feto em desenvolvimento), conhecido como Condylarthra, que se espalhou por grande parte dos continentes. No Paleoceno, esses animais, com unhas transformadas em cascos, modificaram-se em grandes predadores, semelhantes a cães, e em animais herbívoros, tornando-se assim o primeiro grupo de mamíferos a se alimentar de plantas.

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Phenacodus, ungulado primitivo do Paleoceno

Na África, surgiram os primeiros ancestrais dos elefantes, que se tornariam os maiores animais terrestres atuais, milhões de anos depois. Esses animais semi-aquáticos possuíam pequenas trombas e presas que provavelmente eram mantidas dentro da boca.

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Phosphatherium escuillei, um dos primeiros elefantes conhecidos – Imagem por Roman Uchytel

Já na Ásia, surgiram os primeiros roedores verdadeiros (Rodentia) e coelhos e lebres (Lagomorpha), que não iriam se diversificar muito até a diversificação da grama, na próxima época que veremos. Os roedores eram, majoritariamente, arborícolas, enquanto os lagomorphos eram pequenos animais semelhantes aos  Ochotonideos atuais, que viviam em tocas subterrâneas.

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Paramys, um dos primeiros roedores conhecidos – Arte por S. Roberts
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Pika-chines (Ochotona curzoniae) é um lagomorpho atual muito semelhante a seus ancestrais do Paleoceno – Foto por Lee Anne Shaffer

Os primeiros protoprimatas surgiram no final do Cretáceo como pequenos animais arborícolas e, possivelmente, nectarívoros e insetívoros. Já no Paleoceno, tomaram forma mais semelhante aos dos lêmures atuais.

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Purgatorius, protoprimata mais antigo conhecido que surgiu no fim do Cretáceo e sobreviveu à extinção K-T. – Desenho por Nobu Tamura
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Carpolestes, protoprimata da América do Norte – Reconstrução por Doug M. Boyer

Enquanto isso, na América do Sul, Austrália e Antártida (que ainda era coberta por densas florestas), os marsupiais ocupavam nichos semelhantes aos dos gambás e cuícas atuais. Ao mesmo tempo, também na América do Sul, apareceram os primeiros Xenarthras, grupo de animais que incluem os tatus (Cingulata) e as preguiças e tamanduás (Pilosa), que se tornariam os protagonistas de nosso continente até o Pleistoceno.

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Riostegotherium, tatu primitivo do Paleoceno

Nesse continente, dinossauros sobreviventes da extinção do Cretáceo iram se tornar os maiores predadores da América do Sul nos próximos milhões de anos. Durante o Paleoceno, essas aves da ordem Cariamiformes especializaram-se em caçar os pequenos marsupiais sul-americanos e alguns pequenos ungulados primitivos da região.

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Paleopsilopterus itaboraiensis, uma das primeiras “aves-do-terror” conhecidas –  Por Geraldo França Jr.

Em diversas regiões do mundo, as aves tomavam formas muito similares aos das atuais, com o surgimento de corujas e flamingos (Phoenicopteridae). A extinção de aves marinhas do Cretáceo, como o Hesperornis, possibilitou que um grupo de aves perdessem a sua capacidade de voo e se tornassem adaptadas para o meio aquático, dando origem aos primeiros pinguins no continente chamado Zelândia.

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Waimanu manneringi, o primeiro pinguim verdadeiro – Arte por Roman Uchytel

Os répteis Sul-Americanos eram, sem dúvida, os maiores predadores do planeta durante o Paleoceno. O continente contava com crocodilos corredores, quelônios carnívoros, de até 3 metros de comprimento, e com cobras como a Titanoboa, uma serpente semi-aquática que ultrapassava os 13 metros e pesava mais de uma tonelada.

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Sebecus, crocodilo terrestre Sul-Americano – Imagem por Marcus Burkhardt
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Titanoboa alimentando-se de jacaré – Por Ícaro Yuji
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Quelônio carnívoro da América do Sul – Por Maija Karala

Durante o fim do Paleoceno, o planeta sofreu um aquecimento de 3ºC em apenas 20 mil anos, o que alterou a química dos oceanos e a umidade em todos os continentes e, consequentemente, moldou a evolução dos próximos milhões de anos. Esse aquecimento repentino, conhecido como Máximo térmico do Paleoceno-Eoceno, é o que marca o começo da nossa próxima época geológica.

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Temperatura média do ar em diferentes períodos geológicos –  Fonte :  NCAR

Eoceno – 55 milhões a 36 milhões de anos atrás

As altas temperaturas do planeta possibilitaram que os répteis do Paleoceno sobrevivessem por milhões de anos, até o meio do Eoceno. Embora poucos fósseis tenham sido encontrados no local, evidências mostram que a diversidade de plantas, répteis e mamíferos da Antártida durante esse período era enorme, uma vez que o continente ainda era coberto por uma densa floresta tropical. Lentamente, esse continente foi migrando para o sul através de movimentações tectônicas, desgrudando-se da América do Sul e da Austrália. Nessa mesma época, os primeiros pinguins atingiram o continente, vivendo na costa de um paraíso tropical.

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Imagem presente no artigo “Antarctic Peninsula and South America (Patagonia) Paleogene terrestrial faunas and environments:
biogeographic relationships” representando a fauna e flora hipotética da Antártida durante o Eoceno.

Entretanto, ao atingir sua posição atual, a Antártida criou uma corrente oceânica gelada denominada Corrente Circumpolar Antártica, que circulava em volta do continente e, lentamente, roubava seu calor e umidade. Entre 49 e 40 milhões de anos atrás, o continente congelou completamente, perdendo quase totalmente sua vegetação e extinguindo todos os seus vertebrados terrestres nativos, com exceção dos pinguins.

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Surgimento da  Corrente Circumpolar Antártica resfriou o continente até o meio do Oligoceno

Essa corrente gerou uma diminuição da umidade média de todo planeta, o que reduziu ampla parte das florestas e abriu espaço para vastas concentrações de animais em áreas abertas, que dariam origem aos primeiros perissodáctilos. Grandes animais, como os Brontotheriideos e os Dinocerata, tornariam-se os maiores mamíferos herbívoros da Terra até esse momento. Os Creodonta (animais carnívoros do Eoceno), assim como os primeiros cavalos, rinocerontes, ratos e morcegos dividiam seu território com aves gigantes conhecidas como Gastornis, que se alimentavam de pequenos mamíferos na América do Norte. Nessa época também surgiram as primeiras águias, condores e passarinhos (passeriformes). Cactos e palmeiras espalhavam-se pelos continentes, assim como árvores frutíferas, o que possibilitava alimento para diversos novos grupos de aves e répteis herbívoros. Embora as Poaceas tenham surgido no Cretáceo, foi somente  durante o Eoceno que elas começaram a se espalhar, sobretudo na forma de bambus e de gramas de crescimento sazonal.

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Fauna do Eoceno – Por Stephen Somers
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Gastornis alimentando-se de um cavalo primitivo
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Eoceno da América do Sul – Por Rolandi

Na África e na Ásia, dois grupos de animais migravam, progressivamente, para o mar. O primeiro deles, o dos peixes-boi (Sirenia), surgiu a partir de um grupo de herbívoros terrestres e, rapidamente, migrou para o outro lado do Oceano Atlântico, colonizando a América do Sul. O segundo grupo (Cetacea) surgiu a partir de um grupo de artiodáctilos onívoros que viviam próximos a rios e, posteriormente, migrou para o mar.

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Prorastomus sirenoides, um peixe-boi terrestre basal
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Indohyus sp., ancestral de todos os cetáceos atuais – Arte por Lucas Lima

Por fim, os primeiros primatas verdadeiros surgiram na Ásia. Esses animais noturnos e arborícolas rapidamente colonizaram a África e, posteriormente, atingiram a América do Sul através do fenômeno de balsas flutuantes (Fenômeno explicado no meu texto sobre espécies invasoras)

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 Darwinius masillae, o primata fóssil mais bem preservado que se tem notícia – Por Esther van Hulsen

Oligoceno – 36 a 23 milhões de anos atrás

No Oligoceno surgiram os primeiros macacos-do-velho-mundo, que rapidamente extinguiram os primatas lemuriformes de todo o planeta, com exceção de Madagascar. Esses animais obtiveram grande sucesso na África, uma vez que o continente ainda possuía regiões quentes e úmidas, que possibilitava grandes florestas tropicais.

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Aegyptopithecus, por Roman Yevseyev

Os perissodáctilos eram, sem dúvida, os animais mais bem sucedidos desse período, adquirindo formas únicas na história do planeta e se espalhando pela Europa, Ásia, África e América do Norte. Os cavalos e antas adquiriram formas bem semelhantes a dos atuais, enquanto os rinocerontes cresceram e dominaram diversos nichos que hoje pertencem a outros animais.

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Mesohippus, um cavalo Norte-Americano do Oligoceno – Por Mehdi Nikbakhsh
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Evolução de diversos tipos de cavalos até o Plioceno – Por Julio Lacerda
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Chalicotherium, um rinoceronte do Oligoceno – Por Julio Lacerda
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Com 5 metros de altura e 8 metros de comprimento, o Paraceratherium bugtiense era um rinoceronte sem chifre que ocupava um nicho semelhante ao das girafas. Foi o maior mamífero terrestre conhecido.

Com a redução das temperaturas e da umidade ao longo do Oligoceno, um novo tipo de habitat surgiu no planeta, que mudaria sua história para sempre: as savanas. O clima seco possibilitou a redução de florestas na maioria dos continentes, o que abriu espaço para que a grama se tornasse a forma de vida vegetal dominante. Ao contrário da maior parte das plantas rasteiras da época, a grama contém poucos nutrientes e possui compostos de sílica, denominados fitólitos, em sua estrutura. Essa característica torna sua digestão difícil, além de contribuir para o desgaste dos dentes dos herbívoros. Nesse contexto, surgiram os Artiodáctilos, grupo de animais que incluem os boi, camelos, cervos, cabras, porcos e antílopes atuais, que possuem dentes resistentes e de crescimento contínuo e um sistema digestivo complexo, com regiões fermentadoras capazes de digerir a grama. Esses animais rapidamente se espalharam pelo Hemisfério Norte e África onde ocuparam nichos de predadores e presas.

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Archaeotherium, um porco gigante carnívoro do Oligoceno – Por Julio Lacerda

Neogeno – 23 milhões de anos atrás até hoje

A transição do Paleogeno para o Neogeno é sutil no registro fóssil, e é demarcada pela extinção de alguns grupos de protozoários marinhos. Entretanto, o inicio desse período é marcado pelo surgimento do Himalaia, uma vez que a Índia, que havia permanecido isolada por milhões de anos, chocara-se com a Ásia e continuava migrando para o Norte.

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Mapa do planeta durante o Mioceno

Mioceno – 23 a 5.3 milhões de anos atrás

Durante o mioceno, as savanas cobriam a maior parte do planeta, com exceção da Antártida,  e substituíram também as grandes florestas da África. Isso fez com que a maior parte dos macacos, que até então eram majoritariamente arborícolas, começassem a viver em campos abertos. Cerca de 18 milhões de anos atrás, surgiram os primeiros ancestrais dos hominídeos, que dariam origem a todos os gibões, orangotango, gorilas, chimpanzés e humanos.

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Proconsul, o ancestral de todos os hominídeos atuais

Ao longo dos últimos milhões de anos, os ancestrais dos cetáceos foram, gradativamente, adquirindo adaptações para a vida aquática e aumentando de tamanho, com espécies de até 12 metros de comprimento. Enquanto isso, surgiram as primeiras lontras-marinhas do planeta, que passaram a viver nas primeiras florestas de Kelpie do mundo.

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Evolução dos ancestrais das baleias do Mioceno

A extinção dos répteis gigantes marinhos do Mesozoico possibilitou que os tubarões se tornassem os predadores dominantes do Cenozoico. Durante o Mioceno, esses animais adquiriram tamanhos descomunais, uma vez que o surgimento de grandes baleias possibilitou uma fonte de alimento rica em gordura.

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O Carcharodon megalodon podia atingir até 20 metros de comprimento – Fonte: Sciente Photo Library

Se fôssemos transportados ao fim do Oligoceno, provavelmente reconheceríamos a maior parte dos mamíferos do planeta. Elefantes dividiam as savanas da Europa, Ásia, África e América do Norte com cavalos, camelos, leões, ursos, hienas, lobos e antílopes. Nas florestas da Ásia, tigres caçavam orangotangos e girafas comiam folhas de bambus.

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Fauna africana do Mioceno – Por Mauricio Anton

Na América do Sul, crocodilos gigantes e aves-do-terror ainda eram os maiores predadores. Tatus e preguiças gigantes dividiam o habitat com ungulados muito diferentes dos existentes atualmente, que eram caçados por grandes marsupiais dentes-de-sabre carnívoros e por condores de mais de 7 metros de envergadura.

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Argentavis roubando a presa de um marsupial gigante – Por Thylacosmilus atrox by Velizar
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Purussauros, jacaré de 13 metros do Mioceno caçando Phoberomys, um roedor gigante da América do Sul – Por Julio Lacerda
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Thalassocnus natans, preguiça gigante aquática – Por Roman Yevseyev

Plioceno – 5,3 até 2,6 milhões de anos atrás

No início do Plioceno, na região da Etiópia, surgiu uma espécie denominada Australopithecus, o primeiro ancestral direto dos seres humanos conhecido. Esses pequenos animais bípedes provavelmente viviam em florestas de galeria e faziam excursões para as savanas, onde se alimentavam de frutas e de tubérculos.

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Australopithecus, por John Gurche

Nessa época, a migração da América do Sul para o Norte fez com que os dois continentes finalmente se encontrassem, na região em que hoje é o Panamá. Esse contato fez com que os camelos, ursos, onças, veados, elefantes e antas Norte Americanos finalmente chegassem ao nosso continente, enquanto preguiças gigantes e aves-do-terror migraram para o norte. Essa foi, provavelmente, a maior troca faunística da história, em um evento que ficou conhecido como o “Grande Intercâmbio Americano”.

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Troca faunística ocorrida durante o Grande Intercâmbio Americano – Por Smithsonian Tropical Research Institute
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Um Titanis protege seus ovos de um pequeno felino
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Fauna brasileira após o Intercâmbio. Nessa imagem podem ser vistos animais tradicionalmente neotropicais (Como as Macrauchenias à frente e tatus e preguiças gigantes ao fundo) e espécies originalmente norte-americanas como tigres, cavalos e elefantes – Por Mauricio Antón

Pleistoceno – 2,6 milhões a 12 mil anos atrás

O Pleistoceno é conhecido por muitos como a “Era do Gelo”, uma vez que uma série de eventos de glaciação moldaram o planeta e extinguiram localmente grande parte das espécies cosmopolitas da época. Espécies icônicas, como os mamutes, rinocerontes lanudos e leões-das-cavernas eram comuns no hemisfério Norte, enquanto o hemisfério Sul tornava-se cada vez mais seco e, portanto, com um baixo número de florestas.

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Fauna europeia durante o Pleistoceno – Por Mauricio Antón

Devido à menor umidade do planeta, a competição entre os carnívoros aumentou significativamente nas Américas, o que extinguiu a maior parte das aves-do-terror durante o Pleistoceno, com exceção da família Cariamidae, que ainda possui dois representantes atuais (seriemas).

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Titanis, maior ave-do-terror da história, lutando contra um Smilodon – Por Julio Lacerda
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Seriema (Cariama cristata), representante vivente das aves-do-terror – Foto por Pedro Henrique Tunes

O resfriamento do planeta criou enormes quantidades de zooplâncton próximas dos polos, tornando-se fonte de alimento para os maiores animais que já estiveram em nosso planeta. A baleia-azul (Balaenoptera musculus) surgiu há cerca de 2 milhões de anos e, ainda hoje, patrulha os mares de todo mundo. Com até 33 metros de comprimento e pesando até 173 toneladas, esse animal possui um coração mais pesado do que um carro e artérias largas o bastante para caber um ser humano.

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Comparação do tamanho de uma baleia-azul com uma baleia primitiva (topo) e com um ônibus de dois andares

Na África, surgiram os primeiros representantes do gênero Homo, cerca de 400 mil anos atrás, que rapidamente se espalharam por todo o continente e, posteriormente, atingiram a Ásia, onde se diversificaram em diversas novas espécies. Cerca de 200 mil anos atrás surgiram as duas subespécies conhecidas de Homo sapiens, que rapidamente atingiram a Europa e a Ásia.

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Algumas das várias espécies de Hominídeos encontradas na África – Fonte:  G. Grullón

Uma pequena espécie de Hominídeo surgiu na Indonésia, conhecida como Homo florensis. Com apenas 1,2 metros de altura, viveram na ilha de Flores, onde conviveram com elefantes anões e com os dragões-de-komodo (Varanus komodensis), lagartos de 3 metros de comprimento que existem ainda hoje.

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Homo florensis por Maurício Antón

A incrível capacidade cognitiva do gênero Homo, sobretudo da nossa espécie, está relacionada com a necessidade de se adaptar a um mundo em constantes mudanças. Isso possibilitou que o Homo sapiens desenvolvesse estratégias complexas de caça, roupas, ferramentas e armas, tornando-o o predador mais perigoso durante o Pleistoceno.

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Homo sapiens caçando um rinoceronte-lanudo – Por Julio Lacerda

Suas estratégias de caça permitiam que eles abatessem até as maiores presas que, devido à sua lenta taxa de reprodução, foram gradualmente entrando em extinção, uma vez que suas populações já estavam baixas devido às bruscas mudanças climáticas. Ao chegar na Austrália, cerca de 60 mil anos atrás, os Homo sapiens extinguiram toda a megafauna local. Nas Américas, o declínio das populações da megafauna também coincide com a chegada humana.

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A maior parte da megafauna australiana foi extinta há 60 mil anos, justamente com a chegada dos primeiros humanos. – Por  Peter Trusler
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Lêmures de 150 quilos conviviam com aves de 3 metros de altura em Madagascar até a chegada dos primeiros hominídeos na ilha

Holoceno – 12 mil anos até hoje

O Holoceno foi a época em que criamos a agricultura e pecuária, construímos cidades e impérios e, deliberadamente, moldamos o mundo a nossa volta. Mamutes nos acompanharam em nossa jornada até cerca de 3 mil anos atrás, quando as pirâmides do Egito já estavam erguidas. Os dodôs nos deixaram há pouco mais de 400 anos, os tigres-da-tasmânia sobreviveram para ver a Primeira Guerra Mundial e o Baiji nos acompanhou até o século XXI. A complexidade do ser humano e de suas relações com o planeta serão abordadas em um texto futuro, mas agora, pela primeira vez na história, um animal está conscientemente extinguindo milhares de espécies por ano e aquecendo a Terra de forma acelerada. Os testes nucleares e a ação dos plásticos nos oceanos possuem um potencial tão grande de alterar o nosso planeta que alguns cientistas propuseram a criação de uma nova era geológica, denominada de Antropoceno: A Era dos Humanos.

Epílogo

Vimos a vida complexa surgir e quase desaparecer, observamos um grupo de animais crescer até atingir tamanhos descomunais e aprender a voar e, após a queda de uma rocha espacial gigante, presenciamos o surgimento de protagonistas improváveis. Pequenos animais noturnos do Jurássico tornaram-se dos maiores animais que já estiveram em nosso planeta aos que mais modificaram seus ecossistemas. Os próximos capítulos de nossa história ainda são incertos, mas nossas atitudes poderão moldar o futuro de nossa biosfera. “A vida encontra um caminho”. Resta a nós permitir que esse caminho não seja destruído.

 

Referências

Canais do youtube Eons e SciShow

Site EarthArchives

Postagem da NatGeo sobre o primeiro primata 

Artigo “Antarctic Peninsula and South America (Patagonia) Paleogene terrestrial faunas and environments: biogeographic relationships” – REGUERO, M. A. et. al.

 

 


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Comentários

6 respostas para “A Teoria de Tudo que está Vivo – Parte III – O Reinado dos Mamíferos”

  1. Avatar de hamilton
    hamilton

    magnífica matéria, sensacional. Surgimento da vida e evolução.

    1. Obrigado! Que bom você gostou.

  2. Texto maravilhoso! Passou as informações de uma forma fácil e muito prazerosa. Muito obrigado!

  3. Avatar de Yorran
    Yorran

    Estava estudando biologia e uma questão sobre o período carbonífero me levou a este site, acabei lendo a matéria completa. Achei o texto informativo sucinto e divertido de se ler. Obrigado !

    1. Que bom você gostou Yorran! Abraço.

  4. Excelente aula !

    Grato

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